sexta-feira, 30 de dezembro de 2011

Faça amor não faça guerra

Copiado de G1-Mundo
A foto acima foi tirada após um quebra-quebra digno do esteriótipo do 3º mundo, após a derrota do time local na final do campeonato. O contexto da cena é inusitado para nós Brasileiros. Não se trata da depredação da Av. Paulista feita torcida do São Paulo Futebol Clube em 2005,  nem da depredação do estádio do Pacaembu pela torcida do Palmeiras, após derrota para o Cortinthians em 2010. Mas, surpreendente foi o fato de o evento ter ocorrido em uma das cidades com maior qualidade de vida do planeta: Vancouver, no Canadá, após uma final de hóquei. 

A foto em si mesma não apresenta nada de mais e apenas se remete aos fatos, ilustrando a reportagem jornalística, tendo sido difundida ao redor do mundo por inúmeros veículos de comunicação e informação. O valor arquivístico dela está parcialmente dissociado do episódio e liga-se às suas reproduções por tais mass medias, seja como registro de notícia veiculada, seja como referência à aquisição dos direitos de divulgação. De modo similar, os detentores dos direitos de autor, publicação e difusão também a guardarão como prova dos mesmos, em paralelo ao seu valor informativo.

O mesmo episódio, no entanto, foi responsável pela produção de outra imagem, muito mais relevante, do ponto de vista de nossa cultura e nossa história, que chegou a ser categorizada como "foto do ano", e retrata um casal em cenas românticas "calientes", no meio do asfalto durante o tumulto. A despeito do altíssimo valor histórico e cultural a reprodução dessa imagem guardará as mesmas relações arquivísticas de sua predecessora (reproduzida no início deste post); isto é: prova de execução de atividades (pela publicação/reprodução) para os mais diversos titulares (jornais, agências de notícias, este blog etc.) e/ou prova de direitos. A diferença está na atribuição de valor dada por nossa sociedade e cultura que, sem dúvida, atribuirá a ela importância imensamente superior aos outros cliques do evento, permitindo que ela quase supere os fatos jornalísticos retratados (o tumulto e a depredação) e se converta em ícone da não violência.

É nessa última acepção que este blog reproduz a candidata a "foto do ano 2011", desejando aos nossos internautas (leitores e colaboradores) um ano novo maravilhoso, com a apropriação de um velho bordão dos anos 1960-70:
Copiado de G1-Mundo

EM 2012 FAÇA AMOR, 

NÃO FAÇA guerra!!!

terça-feira, 20 de dezembro de 2011

Informação arquivística e patrimônio fotográfico


As duas fotos acima referem-se a um mesmo evento e, se corretamente contextualizadas historicamente, nos darão importantes informações sobre a colonia italiana de São Paulo dos anos 1930. Trata-se da inauguração do restaurante do Club Itália, em 1932, que depois, em 1934 virou Yacht Clube Itaupú. O clube foi fundado por imigrantes italianos, entre eles um Matarazzo e um Ramenzoni, na chamada Riviera Paulista na Represa de Guarapiranga. 

A qualidade das reproduções não ajuda muito, mas pode-se observar diversos aspectos socio-históricos na imagem, tais como: a separação de mulheres para uma tomada fotográfica, indumentária e ambientação etc. As imagens sem as informações acima ficariam completamente desprovidas de significado. 

Em termos arquivísticos, no entanto, tais informações são insuficientes, para que possamos saber: 
  • quem é o titular arquivísticos (fundo) dos documentos? 
  • estamos falando de um fundo arquivístico ou de uma coleção fotográfica? 
  • os documentos objetos da análise são os positivos de 1932, cópias posteriores ou a versão eletrônica? 
  • a que função arquivística os documentos estão relacionados com o titular?
Muitas podem ser as possibilidades de resposta para tais indagações, porém nem todas estarão corretas. Um dos maiores desafios da organização de documentos imagéticos de arquivo é o estabelecimento das informações contextuais arquivísticas. Normalmente, frente à dificuldade de tal tarefa, busca-se o trabalho com as informações de contexto histórico e do momento da criação da imagem como se fossem suficientes para dar conta das demandas informacionais do arquivo, que são distintas daquelas do consulente.

Como resolver especificamente o problema do contexto arquivístico das fotos acima? A página do clube atual, referente às informações históricas (veja aqui) não é nada esclarecedora. 

Aceita-se sugestões e responde-se a indagações sobre o percurso de tais imagens...

O desafio está lançado.

segunda-feira, 12 de dezembro de 2011

Pesquisa: Rede Mineira de Viação (RMV, "Ruim, mas vai"): 1931-1953

DIMENSÕES INFORMACIONAIS DE DOCUMENTOS IMAGÉTICOS DO TRANSPORTE FERROVIÁRIO NO BRASIL: 
o caso da Rede Mineira de Viação (1931 – 1953)

Niraldo J. Nascimento - Doutorado (2011-2014)
Orientador: Prof. Dr. André Porto Ancona Lopez
Linha de Pesquisa: Organização da Informação
Grupo de Pesquisa: Acervos Fotográficos
Faculdade de Ciência da Informação 
Programa de Pós-Graduação em Ciência da Informação (PPGCINF)

Resumo
Pesquisa, análise crítica, descrição e contextualização dos documentos imagéticos relacionados ao transporte ferroviário da Rede Mineira de Viação, de 1931 a 1953, especialmente fotografias, sua organicidade e recuperação em arquivos institucionais ou particulares à luz do contexto social-econômico, político e cultural. Como resultado, pretende-se a construção de uma base de dados de documentos imagéticos que reflita, em termos arquivísticos, o tema e período escolhidos, e que se configure como memória e fonte de pesquisa histórica.
Estação da RMV - 1948. Monte Carmelo (MG)
Objetivo Geral
Pesquisar e analisar os documentos imagéticos e seus arquivos institucionais e pessoais sobre a Rede Mineira de Viação, no período de 1931 a 1953, conhecida popularmente como "Ruim mas vai", de modo a realizar uma descrição crítica dos acervos e sua contextualização com os aspectos sócio-econômicos, políticos e culturais vivenciados pelo país no período citado.

Objetivos Específicos
Antigo mapa da malha ferroviária de MG
a) Recuperação da malha rodoviária da RMV e georeferenciamento de seus principais troncos e localidades;
b) Identificar os principais acervos de documentos imagéticos que compõem a história da Rede Mineira de Viação e realizar seu respectivo georeferenciamento;
c) Analisar os documentos e sua organização nos diferentes acervos, físicos ou digitais (suporte), institucionais ou pessoais e realizar uma análise crítica dos mesmos à luz das teorias e metodologias arquivísticas selecionadas;
d) Verificar se os documentos imagéticos e seus respectivos acervos têm representatividade com os aspectos sócio-econômicos, políticos e culturais do período;
e) Resgatar, através de entrevistas pessoais com os principais agentes e/ou seus familiares, a memória do período e contrapô-la à descrição dos documentos imagéticos existentes;
f) Compor uma descrição associada da documentação imagética e dos acervos com o contexto dos mesmos, dentro de uma perspectiva iconográfica e iconológica, compondo uma base de dados computadorizada.

Metodologia
RMV - Viagem a Caxambu (1934)
A pesquisa pretende fazer um percurso pelo tempo e espaço dos documentos imagéticos, tempo esse definido pelo período delimitado e, o espaço, representado em três abordagens diferentes: identificação do espaço geográfico (físico) percorrido pela RMV, o espaço cibernético (virtual) dos acervos e coleções e, finalmente, o espaço físico dos acervos e agentes ligados ao tema, caracterizando uma pesquisa in loco. Tal percurso, corresponde igualmente, à caracterização do universo da pesquisa, sujeito aos recortes que se fizerem necessários.
Estação da RMV em Santa Rita do Jacutinga (MG)
RMV - Ponte sobre o Rio Verde - Soledade de Minas (MG)
  • Delineamento do desenvolvimento da rede física da RMV. Para isso será realizada uma pesquisa histórica dos mapas geográficos existentes adotando as metodologias que se fizerem necessárias;
  • Identificação na Web, com base na área geográfica delineada, dos principais acervos virtuais disponíveis;
  • Identificação e descrição dos documentos imagéticos disponíveis;
  • Identificação, com base na área geográfica delineada, dos principais acervos físicos disponíveis;
  • Levantamento do contexto sócio-econômico, político e cultural do período, através de pesquisa documental, adotando as metodologias que se fizerem necessárias;
  • Visita, in loco, aos principais acervos e coleções, registro fotográfico dos mesmos e digitalização dos documentos mais relevantes;
  • Concomitante ao procedimento descrito no item anterior será realizada uma pesquisa com os agentes humanos envolvidos de forma a mapear narrativas que contribuam para a descrição dos documentos imagéticos.
Produto Final
Imagem meramente ilustrativa da ideia do BD
O produto final será a criação da base de dados computadorizada dos documentos imagéticos georreferenciados e referendados pela pesquisa.

terça-feira, 6 de dezembro de 2011

Fotografar para ocultar?

Imagens copiadas de Chocolá Design

Olhe atentamente para as imagens acima e diga o que elas têm em comum? Se você localizou o Homem Invisível, acertou; parabéns! já pode se candidatar para analisar imagens de camuflagem junto às Forças Armadas. Se ainda não viu ninguém, clique nas fotos para vê-las em tamanho maior e tente localizar Wally, quer dizer Liu Bolin. Na imagem do supermercado é mais fácil, porém custei a encontrá-lo na foto do trator. 

O efeito visual incrível só é obtido após uma árdua preparação do modelo, literalmente pintado de acordo com o fundo da cena, nos  mínimos detalhes. A respiração do modelo também influencia e as fotos divulgadas provavelmente representam uma escolha de um incontável conjunto de takes e testes. O ângulo e iluminação para a tomada da imagem também são essenciais para que a ilusão funcione. A perspectiva, que jamais nos dará a profundidade de uma cena, apenas sua simulação (por convenção, familiaridade e iconicidade) também colabora bastante. 

Em uma cena real, ao vivo, em 3D, poderíamos ser momentaneamente iludidos apenas. Um simples movimento de nosso corpo, de nossa cabeça, que nos fizesse mudar o foco da visão, imediatamente destruiria a "magia" da cena. Ser mágico de show deve ser mais complicado do que homem invisível de fotos; daí a necessidade que o primeiro tem de buscar artifícios para "congelar" a atenção do público. No segundo caso, o esforço está em manter-se congelado junto com todo o ambiente no momento do click.

A brincadeira nos coloca importantes questões do ponto de vista do tratamento com a informação fotográfica, na medida em que não podemos acreditar que sempre iremos conseguir identificar todos os elementos de uma imagem fotográfica. Por vezes eles poderão estar ocultos, intencionalmente (como nos exemplos acima), acidentalmente (e podermos nunca nos dar conta disso), tecnicamente (como a ausência de pessoas em grandes cidades em fotos início do século XX), ou até mesmo historicamente (elementos que não são imediatamente identificáveis pela nossa atual cultura visual, mas que poderiam sê-los no passado). 

No caso dos arquivos, se o contexto arquivístico de criação arquivística não for considerado como elemento qualificador do documento o risco de perda de organicidade é muito grande e pode comprometer irremediavelmente sua qualidade de documento de arquivo. Não se trata de cair da falácia positivista da "objetividade" Vs. "subjetividade", porém de tentar entender o documento dentro do complexo ambiente no qual se originou (e sua compreensão vai muito mais além do registro fotográfico, englobando a cultura, a técnica, as pessoas, os equipamentos, a história etc.) naquilo que é a parcela mais invariável de tal complexidade.

A questão que se coloca, então, é como tratar arquivisticamente documentos imagéticos que nos ocultam informações visuais fundamentais. A resposta é simples, tratando-os como documentos de arquivo, isto é: compreendendo antes suas informações e vínculos contextuais. No exemplo deste post a organização de fotos que têm por função principal camuflar o modelo apresentarão uma solução bastante distinta da organização que seria dada a fotos sobre máquinas de construção civil e comércio varejista.

Recentemente Joan Boadas proferiu palestra sobre patrimônio fotográfico e indicou a necessidade de uma compreensão mais lata e ampla do conceito de patrimônio, que não pode ser restrito às imagens. Isabel Wschebor agregou comentário sobre a importância da contexto arquivístico como elemento mais invariável para direcionar o delicado processo sistematização de significado informacional aos documentos fotográficos de arquivo. 
  • Algumas diretrizes básicas que nortearam a abordagem sobre patrimônio na palestra de Joan Boadas podem ser vistas aqui
  • A mencionada palestra pode ser vista na íntegra aqui (é o vídeo com 2h:34min:45seg).
  • Breves informações sobre Joan Boadas podem ser obtidas aqui
  • Breves informações sobre Isabel Wschebor podem ser obtidas aqui

terça-feira, 29 de novembro de 2011

WICI discutirá temáticas relacionadas às fotografias


O já tradicional evento do Programa de Pós-graduação em Ciência da Informação da UnB deste ano terá uma especial atenção para o universo das fotografias. A palestra de abertura contará com a presença do coordenador do grupo de trabalho do Conselho Internacional de Arquivos sobre arquivos fotográficos e audiovisuais - PAAG (ver aqui), o diretor do Arquivo de Girona (Catalunya) Joan Boadas. A palestra de encerramento terá como convidada Isabel Wschebor do Arquivo Municipal de Montevideo e também pesquisadora do PAAG. O Grupo de pesquisa Acervos Fotográficos (GPAF) ainda promoverá uma reunião aberta, que contará com a presença dos ilustres convidados.

O 7º WICI é aberto para o público em geral, sem necessidade de inscrições. Além disso, contará com transmissão on-line em tempo real, para os demais interessados. Maiores informações (bem como o acesso à TV-WICI) podem ser obtidas diretamente aqui.

Atenção para as datas e horários dos eventos de maior interesse para os participantes deste blog:

quinta-feira, 24 de novembro de 2011

Memórias fotográficas: a história das salas de cinema de Vitória


O livro Memórias Fotográficas das Salas de Cinema de Vitória contempla alguns dos cinemas que funcionaram em Vitória, apesar do título também apresenta imagens dos cinemas da Região Metropolitana e do interior do estado. O trabalho é um resultado da pesquisa do projeto CINEMEMÓRIA - A História das salas de cinema do Espírito Santo, com a coordenação do Professor André Malverdes do Departamento de Arquivologia da UFES durante 11 anos de pesquisa em arquivos públicos, jornais, acervos pessoais e familiares. 

O livro tem patrocínio da Lei Rubem Braga da Prefeitura Municipal de Vitória e da Arcellor Mittal, com apoio do Departamento de Arquivologia da UFES, Programa de Pós Graduação em História/UFES, Arquivo Público do Estado do Espírito Santo, Associação dos Arquivista do ES, Gráfica Santo Antônio e Rima Comunicação Estratégica. A obra apresenta 110 imagens que contemplam as salas de cinema no ES desde o seu primórdio em 1907 até a década de 1990 com fotos das inaugurações, estréias, interiores, público, fachadas e notícias dos jornais e revistas do estado.

O livro estará a venda na Livraria da UFES no campus de Goiabeiras, no Sebo Veredas na Rua da Lama e durante o lançamento com palestra do autor em local e data ainda a ser confirmado. Esperamos que este trabalho possibilite a todos a satisfação de um passeio pelos “cinemas de calçada”, que era, então, a maior diversão da população. Entendemos que, assim como à época, o prazer de ir ao cinema é, ainda hoje, sinônimo de sonho e magia.

Mais informações:
Andre Malverdes (malverdes@gmail.com)
Professor do Departamento de Arquivologia/UFES

segunda-feira, 31 de outubro de 2011

Recursos para trabalhar com imagens via Web

Pong. Hands and filmstrips - Copíado de Free Digital Photos.net
Muitas vezes para que se possa fazer uma reflexão sobre documentos imagéticos de arquivo a exemplificação e a ilustração podem facilitar o entendimento e a recepção do texto. O uso indiscriminado do "recorta-e-cola", além de gerar problemas quanto à organicidade documental (ver aqui) além de infringir direitos de autor e de divulgação (ver post sobre o tema aqui). O coleg@ Juan Chileno Milla, que é peruano, nos dá uma útil dica de 16 ferramentas gratuitas para a edição de imagens (clique aqui), além dos links para 15 bancos de imagens de uso gratuito para fins não comercias (veja aqui). Agora além da dica aos colaboradores deste blog para a correta referenciação do material utilizado fica divulgada a informação sobre recursos facilitadores.

Veja aqui o post original de Juan Chileno e aproveite para conhecer interessantíssima comunidade docente virtual.

Publicado originalmente em Diplomática e Tipologia Documental

quinta-feira, 27 de outubro de 2011

Dia internacional do patrimônio audiovisual

Hoje, dia 27 de outubro, celebra-se o
Dia Internacional do Patrimônio Audiovisual !


"Auto-retrato" de Joe Clark (vulgo "Hill Billy Snap Shooter"). Copiado do blog "A View to Hugh"
A câmara da cidade de Girona (Catalunya) através do Centro de Pesquisa e Difusão da Imagem (CRDI), com a colaboração do Conselho Internacional de Arquivos, celebraram a data com a publicação de um poster (baixe aqui em inglês) sobre a cronologia do desenvolvimento histórico da mídia audiovisual: cinema, fotografia, televisão, vídeo e gravação sonora. Simultaneamente, foi criado um website em quatro idiomas (catalão, inglês, espanhol e francês) que contém, no momento, 280 referências cronológicas, 30 registros audiovisuais e 140 imagens. 


Clique aqui para ver a notícia completa no site do Conselho Internacional de Arquivos (ICA).
Clique aqui para conhecer a página do Photographic and Audiovisual Archives Working Group do ICA.

quinta-feira, 13 de outubro de 2011

Fotografia e aura

A aura da fotografia x a aura na fotografia

por Keitty Cruz* 

No texto, pequena história da fotografia, Walter Benjamin aborda o tema aura da fotografia. O que seria isso? Seria o mesmo que aura na fotografia? A aura é definida como é um elemento imaterial, que emana e envolve seres ou objetos e é também, por vezes, considerada como um atributo inerente aos seres vivos, segundo várias religiões e tradições esotéricas.  Para Benjamin (1993), a aura é uma “figura singular, composta de elementos espaciais e temporais: a aparição única de uma coisa distante, por mais próxima que ela esteja” (p. 101). O autor considera a aura como um instante, um momento capturado de maneira intrigante em uma imagem.
Observar, em repouso, numa tarde de verão, uma cadeia de montanhas no horizonte, ou um galho, que projeta sua sombra sobre nós, até que o instante ou a hora participem de sua manifestação, significa respirar a aura dessa montanha, desse galho. (p. 101)
Um exemplo de fotógrafo que conseguiu captar a aura da fotografia é Eugène Atget. Para Benjamin (1993), as fotografias de Atget “sugam a aura da realidade como uma bomba suga a água de um navio que afunda” (p.101).

"Marchand d'herbes, place Saint-Médard" (1898). Copiado de

Já a aura na fotografia se trata de uma temática diferente da abordada por Benjamin (1993), é um assunto místico. Fotografar a aura de um ser humano, significa registrar o campo energético que envolve seu corpo. Essa técnica surgiu em 1940, quando Semyon Kirlian e sua esposa Valentina Kirlian criaram uma máquina fotográfica capaz de fotografar a aura humana. Acredita-se que, com esse tipo de fotografia, é possível diagnosticar o estado de saúde físico e emocional das pessoas fotografadas. De acordo com o site misteriosantigos.com,”as colorações básicas encontradas na foto da aura são: vermelho, azul, amarelo e verde”. O diagnóstico vem a partir da interação das variedades e intensidade das cores, pois “a aura varia de intensidade e de cores conforme os estados psicológicos, orgânicos, emocionais e espirituais das pessoas”. 
Copiado de Foto Kirllian
Portanto, a aura da fotografia e a aura na fotografia são temáticas diferentes. A primeira se relaciona com a habilidade de tirar fotografias interessantes, e a segunda está relacionada com aspectos místicos de captura do estado da energia que cerca o objeto fotografado.

* Mestranda em Ciência da Informação/UnB
Lattes: http://lattes.cnpq.br/8137011279067297
Referências:

terça-feira, 27 de setembro de 2011

Folksonomia e indexação de fotos

Copiado de Netnografando

Considerações sobre o uso da folksonomia como recurso para indexar fotografias postadas em ambiente web

Alessandra dos Santos Araújo *

O termo folksonomia foi utilizado pela primeira vez por Thomas Vander Wal numa lista de discussão sobre Arquitetura da Informação, em 2004. À época, os profissionais da área estavam atentos e curiosos sobre a estratégia de classificação inovadora que websites como Del.icio.us e Flickr adotavam. Os usuários destes websites enviavam suas contribuições de conteúdo juntamente com qualquer palavra-chave descritora que entendessem pertinentes. Estas tags ou etiquetas eram usadas para posterior recuperação da informação, sem qualquer controle por parte do website. 

Na lista de discussão, Eric Scheid propôs o termo “folk classification” e Thomas Vander Wal complementou sugerindo “folksonomy”, aglutinando o termo “folk”, do germânico, que significa “povo”, e “taxonomy”, do grego, “regra de divisão”. A folksonomia se tornou popular a partir do momento em que foi lançado pelo Del.icio.us, um serviço de bookmarking online centralizado no indivíduo. Este serviço nasceu a partir de necessidades bem pessoais, onde as pessoas indexavam suas fotos, de acordo com seu interesse e necessidade, sem seguir normas, ou regras de vocabulários controlados. 

Quando falamos em indexação de imagem podemos citar Panofsky (1979), que propõe que a análise da imagem seja dividida em três níveis: pré-iconográfico, iconográfico e iconológico. Podemos resumir da seguinte forma os três níveis de Panofsky: o nível pré-iconográfico, como uma descrição; o iconográfico, como uma análise; e o iconológico, como uma interpretação. Jongersen (1996), afirma que o maior problema intelectual envolvendo a indexação de imagens é como indexá-la. Segundo a autora, isso acontece por falta de estudos sobre a percepção humana de imagens pictóricas. Não é possível realizar uma boa indexação de imagens sem compreender como o ser humano “lê”, e compreende a imagem. Com o surgimento dos sites onde “depositamos” as fotografias, geralmente de cunho pessoal, a folksonomia ou a forma descontrolada de indexar, foi aumentando. Para Catarino e Baptista (2007), um dos problemas causados pela folksonomia é a polissemia, a sinonímia e a ambiguidade, que ocorre porque a folksonomia não trabalha com padrões ou critérios pré-definidos, nem mesmo com objetivos. Cada um atribui a etiqueta que lhe é mais conveniente. Muitos projetos de acervos de fotografias estão sendo disponibilizados na internet, com o objetivo de divulgar suas imagens, que contam com a colaboração livre dos usuários para tagear as fotografias. 

Um projeto inédito onde os usuários colaboram para esse processo acontece nos Estados Unidos, na Biblioteca do Congresso. As fotografias ficam disponíveis para os usuários do Flick, através do blog da biblioteca (http://blogs.loc.gov/loc/2008/01/my-friend-flickr-a-match-made-in-photo-heaven/). 

A Biblioteca do Congresso já publicou duas coleções no Flickr: a American Memory: Color photographs from The Great Depression, com 1615 fotos dos anos 1930 e 40, período de grande crise nos EUA; e a The George Grantham Bain Collection, com 1500 fotos P&B de trabalhadores e da cidade de Nova York dos anos 1910. Um exemplo da aplicação da folksonomia no projeto da Biblioteca do Congresso é a imagem abaixo:

Artesãs trabalhando em fábrica de tapetes. 
Fonte: http://www.flickr.com/photos/library_of_congress/2163450764/in/set-72157623212811048/
Na fotografia acima selecionamos algumas tags utilizadas pelos usuários para indexar: 

O que observamos no caso acima apresentado é, a rigor, a indicação daquilo que a imagem, por meio de tags, representa para o usuário, o que se dá sem a utilização de regras, sem normas, sem referência a maiores detalhes que possam ser considerados na recuperação. Vale dizer que a folksonomia não substitui um vocabulário controlado, nem uma análise mais elaborada de uma fotografia, assim como seu conteúdo e seu significado. Trata-se de um novo recurso, que com o advento da web 2.0, representa o modo como as pessoas se comportam, se identificam e se relacionam com o fato fotográfico.

É portanto, uma forma nova de fazer uma leitura pessoal dos acervos fotográficos disponibilizadas na internet. Por outro lado, a folksonomia não deve ser vista apenas como mais uma forma de classificar, mas deve ser entendida também como uma estratégia cultural, particularmente apropriada pelas redes sociais, ou para sites de compartilhamento, mediando a relação do individuo com a esfera pública e particular da sua vida. Não podemos considerar descontrolado o vocabulário criado por um usuário, por meio da folksonomia, para identificar suas fotografias. O controle não é forçado, não obedece regras, apenas considera ou representa uma primeira percepção do indivíduo sobre a imagem.

* Mestranda Pós Graduação em Ciência da Informação – UNB. 
Aluna da disciplina Seminário em Acervos Fotográficos.


REFERENCIAS

BIBLIOTECA DO CONGRESSO DOS ESTADOS UNIDOS. http://www.flickr.com/photos/library_of_congress/2163450764/in/set-72157623212811048/ (Blog). Washington, 2011. Acesso em: 2 de julho de 2011. 

CATARINO, Maria Elisabete; Baptista, Ana A. Folksonomia: um novo conceito para a organização dos recursos digitais na web. In: Revista DataGramaZero, v.8, n.3, jun. 2007.

JONGERSEN, Corrinne. Indexing imagens. Testing na image descption template. In: ASIS 1996 (Annual Conference Proceedings). October, p. 19-24.

PANOFSKY, E. Significado nas artes visuais. 2.ed. São Paulo: Perspectiva, 1979. (Debate, 99).

SMIT. Johhanna W. A representação da imagem. In: Informare – Caderno do Programa de Pós Graduação em Ciência da Informação, Rio de Janeiro, v.2, n.2, p 28-36, jul./dez. 1996.

quarta-feira, 14 de setembro de 2011

GPAF na UNESP-Marília


No dia 20/09/2011 três pesquisadores do GPAF estarão participando de atividades na UNESP/Marília. A profa. Telma Carvalho (vice-líder do grupo) será a responsável pelos trabalhos que estão assim divididos:

  • Manhã: apresentação de projetos de fotografia desenvolvidos na Unesp/Marília
  • Tarde 1ª parte: palestra Profa. Aline Lacerda (UFF)
  • Tarde 2ª parte: apresentação sumária dos trabalhos desenvolvidos pelo núcleo da UnB do GPAF (responsável: Prof. André Lopez).

Maiores informações: telmaccarvalho@marilia.unesp.br

quarta-feira, 7 de setembro de 2011

O significado de 11 de setembro em sua mais controversa foto

Foto de Thomas Hoepker. Copiada  de The Guardian
Este post é uma tradução livre do artigo "The meaning of 9/11's most controversial photo", de Jonathan Jones, publicado no Guardian, por Niraldo J. Nascimento - Doutorando em Ciência da Informação da UnB, no Grupo de Pesquisa de "Acervos Fotográficos"
Nesta imagem de Thomas Hoepker, membro da famosa agência (cooperativa) Magnum, tirada em 11 de setembro de 2001, um grupo de nova-iorquinos conversa tranquilamente em um parque do Brooklyn. Atrás deles, a água azul, o céu azul e uma terrível nuvem de fumaça e poeira que sobe acima de Manhattan, a partir do lugar onde as duas torres foram atingidas por aviões sequestrados, matando cerca de 3.000 pessoas.
Hoepker, optou por não publicá-la em 2001 e excluí-la do livro de fotos da Magnum. Somente em 2006, no quinto aniversário dos ataques, apareceu em um livro, causando uma polêmica instantânea.
O crítico e colunista Frank Rich escreveu sobre isso no New York Times. Ele viu nesta imagem, inegavelmente perturbadora, uma alegoria do fracasso dos Estados Unidos para aprender quaisquer lições profundas a partir daquele dia trágico, a alteração ou reforma de uma nação: "Os jovens na foto Sr. Hoepker não são necessariamente insensíveis. Eles são apenas norte-americanos."
Em outras palavras, em um país que acredita em mudanças, eles já seguiram em frente, aproveitando o sol, apesar da cena de carnificina em massa que deixou cicatrizes em um lindo dia. Na verdade, eu não posso deixar de pensar nesses cinco nova-iorquinos aparentemente impassíveis, que lembram os personagens da famosa comédia de televisão Seinfeld da década de 1990, que no episódio final, são condenados sob a lei do “Bom Samaritano”, por não se preocuparem com os outros.
A rica visão da imagem foi imediatamente contestada. Walter Sipser, identificando-se como o cara do lado direito da foto, disse que ele e sua namorada, aparentemente se bronzeando em uma bancada, estavam, de fato, "em um profundo estado de choque e descrença". Ambos reclamaram que Hoepker os fotografou sem permissão, de uma maneira que deturpou os seus sentimentos e comportamento.
Bem, você não pode fotografar um sentimento. Passados cinco anos desde que foi publicada pela primeira vez em 2006, parece inútil discutir sobre a moralidade das pessoas na imagem, ou do fotógrafo, ou a sua decisão de reter a imagem da publicação. Ela estabelece-se agora, como uma das fotografias que definem aquele dia. Como o 10 º aniversário da destruição do World Trade Centre está se aproximando, o The Observer Review republicou-a neste mês de agosto, como sendo “a fotografia” de 11/09.
É a única fotografia daquele dia a fazer valer a arte do fotógrafo: entre centenas de imagens devastadoras feitas por amadores, bem como de profissionais, que nos horrorizaram e fascinaram, porque eles registraram os detalhes de um crime que ultrapassou a imaginação (mesmo Osama Bin Laden não esperava tal resultado). Esta se destaca como uma irônica, distanciada, e, portanto, habilidosa imagem. Talvez a verdadeira razão pela qual Hoepker não a publicou na época, tenha sido não valorizar sua própria astúcia como artista, no meio a um abate em massa.
Hoje, o significado desta fotografia não tem nada a ver com julgar os indivíduos. Tornou-se um quadro sobre a história e sobre a memória. Como uma imagem de um cataclismo histórico, ela capta algo que é verdadeiro de todos os momentos históricos: a vida não pára por causa de uma batalha ou um ato de terror que está acontecendo nas proximidades. Artistas e escritores afirmaram esta verdade ao longo dos séculos. Em sua pintura “A Queda de Ícaro”, o pintor renascentista Pieter Bruegel retrata um camponês arando quando Ícaro cai para a morte, no mar. É uma observação muito semelhante à de Hoepker. WH Auden escreveu algumas linhas sobre o poema de Breughel a respeito dessa pintura do Musée des Beaux Arts, que se aplicam perfeitamente à fotografia: "Na pintura Ícarus, de Breughel, por exemplo: tudo se afasta / vagarosamente do desastre ...".
Stendhal capta igualmente a dissonância da história em seu romance “A Cartuxa de Parma”. Um jovem de voluntários vai lutar contra Napoleão em Waterloo, mas em vez de um momento de definição e de coragem, todas as experiências que eles têm são aleatórias, marginais, no sentido de acidentes na aproximação do grande dia.
A história não é uma história heróica, nenhuma memória em um bloco de mármore, com palavras inscritas de dor e raiva imperecíveis. Como Tony Blair - cuja própria resposta a esse ato de crueldade desumana era ter que lidar com tais consequências históricas – diz sobre aquele dia, em seu livro “A Journey”: "É impressionante a rapidez com que o choque é absorvido e o ritmo natural do espírito humano reafirma-se... Lembramo-nos, mas não como nós sentimos naquele momento."
Lembro-me perfeitamente do choque daquele momento. Tenho pesadelos sobre isso, o que é estranho, considerando que eu não sou um americano e somente testemunhei pela televisão em Hackney, Londres. Mas eu amava profundamente New York - era um ataque a tudo o que eu amava. No entanto, os argumentos sobre o significado e a resposta urgente a esse ato colossal de violência iniciou-se imediatamente. Para cada número de mortos que você possa ler sobre esse dia de horror, iniciou-se uma "guerra ao terror" que resultou em 12.000 mortos por homens-bomba no Iraque ...
E assim, 10 anos depois, o significado desta fotografia é que as lembranças se esvaem rapidamente. As pessoas em primeiro plano somos nós. Somos nós aqueles cujas vidas continuaram, tocadas e ainda intocadas, separados a partir do coração da tragédia pela água azul do tempo, cada vez mais ampla e impossível de atravessar. Um evento de 10 anos atrás pertence à história, e não o presente. Para sentir o arrependimento de agora você precisa parar para assistir um documentário - e então irá mudar para algo mais leve, ou porque é dolorosamente claro que muito sangue foi gasto em todo o mundo em nome deste desastre, ou simplesmente porque mudar de canais é o que fazem os humanos. As pessoas nesta fotografia não podiam ajudar.
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Comentários são bem-vindos!!!

quarta-feira, 24 de agosto de 2011

A ilusão da visão provocada

Olá  amigos do DIGIFOTO!

Recebi algumas imagens esta semana via email e gostaria de compartilhar com vocês, ao colocar o título no post, foi uma tentavida de demonstrar o quanto uma imagem pode nos iludir.




Tenha cuidado ao ultrapassar, poderá ser atingido pelo pescoço da garrafa.















O que seria isso? Uma bolsa?








Tenham cuidado com os peixinhos.....é uma carga muito preciosa.










Cadê a carga? Queimou.......... e agora????








Essa!! Ficou bacana, será que a cobra vai conseguir......ahhaha.







  Estas pinturas nos caminhões nos mostram um pouco do que abordamos nos posts anteriores, quando estamos falando sobre o poder da imagem criada parecer com o real. Ou seja, nos fazemos essa interpretação.

A colocação  destas imagens, foi inspirada na imagem do cachimbo de Magrite, pois o que realmente é uma imagem diante do real? Mas, afinal que real é esse? 



Grande abraço à todos, esse post, foi somente para descontrair.

quinta-feira, 11 de agosto de 2011

Quem sou? À que motivos estou aqui e qual será o meu fim?

Fonte: http://olharsecular.blogspot.com/2011/02/quem-sou-eu.html
Imagens/fotografias na internet sem informação de conteúdo, de contexto administrativo ou de origem deslocadas no tempo e espaço.

Na internet há uma grande quantidade de imagens e/ou fotografias disponibilizada ao público, no entanto o que podemos observar, é que estas imagens passam a ser de uso geral, como não constam as informações de conteúdo, de contexto administrativo ou de origem, podendo ser descritas, contextualizadas e re-contextualizadas de acordo com interesse de cada usuário.  Esta é uma visão de acordo com autores sobre o entendimento da imagem pictória/fotografia (BAXANDALL,1991;  GOMBRICHI, 2007,2008; KOSSOY, 2009a, 2009b, 2007; PANOFSKY, 1995, 2001).

O que vemos, é uma série de documentos imagéticos sem descrição, de acordo com Lopez (2011)[1], “o documento imagético sem descrição, será somente considerado fotografia”. Porém, o usuário na tentativa de fazer uma descrição vai estruturá-la pelo  seu ponto de vista de conteúdo sem uma análise crítica do contexto administrativo. Assim, cada uma das descrições criadas (feitas) vai trazer a tona uma série de informações, estas dependendo de quem estará fazendo a descrição e essas informações vão acabar sendo influenciada pela bagagem cultural e do conhecimento do descritor em relação à imagem/fotografia. Hoje, com a disponibilidade dos arquivos de imagens e fotografias na rede, podemos observar que os sistemas descritivos são fraco, inclusive para própria busca de uma imagem/fotografia, o que vemos é sempre uma imagem sem o contexto do conteúdo e sem o contexto que motivou a própria imagem/fotografia. Isso se justifica por serem imagens disponibilizadas sem vínculos institucionais, pois de acordo com Parinet (apud LOPEZ, 2000, p. 173) o documento imagético, sem dúvida, está sujeito a uma autonomia maior em ralação ao seu contexto de produção do que seus limites textuais. Essa autonomia, é  basicamente resultado  da falta de dados contextuais potenciais e de outras características não administrativas, como a influência do fotógrafo, do equipamento, do valor estético conforme posíção de Kossoy (2009a, 2009b.2007).

Fonte: http://toforatodentro.blogspot.com/2010/04/quem-sou-eu.html
Então, o que poderíamos dizer é que na internet temos “bancos de imagens/fotografias” no qual poderá ser descrita á nível de conteúdo ou de contexto administrativo conforme o interesse, do uso e da re-utilização da imagem. Desta forma, a imagem/fotografia poderá ser utilizada para outra finalidade diferente da finalidade de origem, transformando-se em outra informação diferentemente da informação de sua origem e fazendo parte de outro contexto conforme o interesse de quem estará fazendo uso de mesma. Nas duas imagens utilizadas neste post, poderão ser acessadas as fontes e visualizar uma reflexão sobre o tema de forma ampla, do "eu como ser" e do "eu fazendo parte de um contexto documental" e assim fazendo uma comparação com a "fotografia ou imagens" na internet deslocadas no tempo e no espaço. Imagem/fotografia, afinal quem sou eu? Antes, um quadro podendo ser uma paisagem ou um retrato pintado a mão, hoje uma fotografia no papel ou numa moldura, ainda dados (bits ou bytes) de uma imagem digital, com que descrição, a que contexto pertenço e a que motivos foram ou são os da minha existência em que tempo e que espaço? Então minha vida e meu fim a quem pertence? Assim, estas questões são levantadas em virtude desse vasto conteúdo imagético na rede. 

[1] Aula do dia 08 de Julho de 2011 no CEDOC-UNB da Disciplina Acervos Fotográficos do Prof. André Porto Ancona Lopez.

 Referências:
BAXANDALL, Michael. O OLHAR RENASCENTE: Pintura e a experiência social na Itália da Recnascença. 1 ed. São Paulo: Paz e Terra, 1991.
GOMBRICH, E. H. ARTE E ILUSÃO: Um estudo da psicologia da representação pictórica. Trad. Raul de Sá Barbosa, 4 ed. São Paulo:  WMF Martins Fontes, 2007.
__________, HISTÓRIA DA ARTE. Trad. Álvaro Cabral. 16 ed. Rio de Janeiro: LTC, 2008.
KOSSOY, Boris. FOTOGRAFIA  HISTÓRIA, 3ed. rev. amp.São Paulo: Ateliê Editorial, 2009a._______, REALIDADE E FICÇÕES NA TRAMA FOTOGRÁFICA, 4 ed. rev. São Paulo,: Ateliê Editorial, 2009b._______,  OS TEMPOS DA FOTOGRAFIA. 2 ed. São Paulo: Ateliê Editorial, 2007.LOPEZ, André Porto Ancona. AS RAZÕES E OS SENTIDOS.  São Paulo: USP, 2000. Tese de Doutorado em História Sociais, Faculade de Filosófia, Letras e Ciências Humanas da USP, 2000.

terça-feira, 26 de julho de 2011

A Narrativa da Foto Invisível


Niraldo J. Nascimento
Doutorando em Ciência da Informação - UnB

Muitas pessoas tiveram a experiência de ouvir histórias, na infância, contadas por pais, avós e outros parentes e algumas delas ficam internalizadas, às vezes por medo, às vezes por beleza, ou outros motivos. Também pode ter sido um conto ou uma novela que lemos ou leram para nós. Chamemos isso de narrativas, embora o termo em voga seja Storytelling, que Palacios (2007, p.15) define como "[...] um termo em inglês utilizado para definir a arte ou a técnica do emprego de histórias como forma de contextualização de um conjunto de informações".

Na década de 70, Robert Pirsig reintroduz o termo "chautauqua" em seu famoso livro "Zen e a Arte da Manutenção de Motocicletas". As chautauquas foi um movimento de educação de adultos que alcançou ampla repercussão nos Estados Unidos, em especial o Movimento Lyceum, que ganhou popularidade e era indissociavelmente ligado ao Transcendentalistas: Ralph Waldo Emerson, um dos primeiros palestrantes (deu cerca de 100 palestras no Concord Lyceum) e Henry David Thoreau, que leu sua publicação - "Desobediência Civil" -  publicamente e pela primeira vez, no mesmo lugar em 1848.

No Brasil, temos a Ação Griô que procura preservar a tradição oral das tribos indígenas brasileiras, como patrimônio nacional.

Ontem me deparei com um conto (uma narrativa), chamado "A Fotografia". Foi postado no blog Caminhar, de minha amiga Laura Diz e escrito por sua mãe, Léa Muniz, ganhador do concurso de contos do Banco Real há alguns anos.

O que me chamou a atenção foi a beleza da narrativa e um aspecto peculiar: as condições da produção estão detalhadamente descritas mas a fotografia não existe. Reproduzo o conto abaixo, com autorização da Laura, no intuito de provocar uma discussão: mesmo sendo uma narrativa, se o contexto de produção existe, a fotografia também existe? Ela pode ser considerada real, não como documento de arquivo, mas como uma criação mental? Ficam abertas as questões.


A fotografia
Lea Muniz Diz

Chovia uma triste chuva de desolação. Meus pés feriam-se nos seixos da rua sem calçamento tentando acompanhar os apressados passos de minha mãe. O guarda-chuva de meu pai, bastante grande para nós duas, na sua precipitação, só servia para me molhar, tanta a chuva que descia pelos meus cabelos e ombros. Atravessamos o portão escancarado e seguimos por uma alameda ladeada por dois renques de ciprestes. Os galhos entrelaçavam-se e, arriados quase até o chão, fustigavam-me o rosto. Lembro que floresciam azaléas vermelhas. Nos fundos a casa simples de madeira. Minha mãe empurrou a porta entreaberta. Alguém, com um sinal de cabeça, apontou a porta à direita e ela me deixou dizendo para que a esperasse. Sentei junto de uma velha negra que desfiava um rosário, intercalando uma vez que outra: Que barbaridade! Outras pessoas chegavam ansiosas. Entravam e desapareciam atrás da porta cerrada para voltarem minutos depois com ar compungido. No fogão crepitavam as chamas da lenha. E junto da parede, perto da chaminé, em uma frigideira enegrecida, um braseiro queimava galhos de alecrim e de arruda de onde subia uma fumaça aromatizada. D. Nercinda, a negra velha, levantou e, com um graveto, revolveu as brasas da defumação. Despejou água quente no bule de café. A chaleira voltou para a chapa que provocava estalidos que se misturavam aos murmúrios no quarto. Houve um gemido alto. Tenha calma, D. Rosa. Tenha calma.. Alguém pegou a bandeja com as xícaras de cafezinho e percorreu a sala. Na minha vez passou adiante. Criança não toma café. Não sabia bem que estava acontecendo. Houve o chamado urgente para minha mãe que saiu quase correndo, arrastando-me pela mão. Na pressa nem calçou meus sapatos.  
O tempo escoava nas mãos quietas da mulheres e nas contas do rosário que se esgueiravam pelos dedos negros. A sala tornava-se pequena à medida que mais gente chegava. A mulher do cafezinho veio até a mim para dizer para eu levantar e dar o lugar para D. Isabel. Fiquei de pé. Minha mãe não vinha. Examinava eu as pessoas a minha volta. Em algum momento caia sobre mim um olhar distante e impessoal. Ninguém me via. Incomodavam-me as roupas ensopadas e tremia sem saber se era de frio ou de nervosismo. D. Nercinda persignou-se, beijou o crucifixo, guardou o rosário em uma bolsa de verniz e finalmente me notou.
- Cruzes, como esta coitadinha está molhada. Vamos lá dentro tirar essa roupa pra secar e tomar uma coisa quente.
Pendurou meu casaco no barbante estendido em cima do fogão e trouxe para mim uma xícara de leite bem quente. Só então me animei a fazer a pergunta guardada:
- Virgínia...Virgínia vai morrer?
Ela suspirou fundo.
- Não sei, minha filha, não sei. Essas coisas a gente nunca sabe. Só Deus. Engoli o leite, agora salgado pelas lágrimas que eu não conseguia conter e que desciam para dentro da xícara.
Quando o médico chegou, D. Rosa deixou-o a sós e veio para a cozinha. Atirou o corpo magro no banquinho de lenha. Vestia-se de preto com um xale verde nos ombros.
- Por quê? Por que ela fez isso, vocês sabem? Me pergunto, me pergunto e não encontro a resposta. 
Pergunto para ela e só me olha. Me olha e sorri. Juro que quando ela sorri tenho vontade de voar em cima dela e dar uma bofetada na cara desavergonhada. Parece que alguém me segura. Deve ser o espírito do falecido. Semicerrou os olhos. Há um mistério. Ela esconde alguma coisa de muito grave. Pensa que me engana. Nunca pôde me enganar. Eu conhecia Virgínia com uma simples mirada.
Uma voz tímida interferiu:
- Não diga conhecia, D. Rosa.
Ela pareceu não escutar e continuou falando como se fizesse para si mesma.
- Era olhar para ela e eu já adivinhava se tinha feito ou não boa prova. Ai, quem havia de pensar. Uma mãe tão boa receber da única filha um golpe como esse. Sei que fui dura algumas vezes. É preciso. Ninguém educa com moleza. ( O símbolo da sua energia pendia de um prego na parede. Não fazia muito Virgínia correu para nossa casa, o rosto marcado pelo rebenque).
Pensei que seria agradecida. Ingrata. Ingrata. (ofegava) Não teve pena da mãe que sacrificou a vida por ela. Recusei muitos homens para não lhe dar um padrasto. (Fez uma pausa). Mas não vai morrer sem contar porque fez isso. Algum namorado? (Seus olhos arregalaram-se e ela se ergueu do banco. Alta, magra de preto, ali, no meio da cozinha se me afigura hoje, uma visão apocalíptica). Deve ter feito alguma coisa vergonhosa. Sentou de novo e deixou-se ficar muda embalando o corpo para frente e para trás, os olhos no chão apertando o xale de encontro ao peito. Ergueu o rosto e pareceu notar as pessoas que a cercavam. Ela devia ter algum namorado. Quem? Foi quando me viu. Estendeu a mão e com os dedos longos e magros lançou o braço na minha direção. Recuei assustada, encostando-me na negra. Ela defendeu-me:
- Ora, D. Rosa, que pode saber uma criança? Se Virgínia tivesse um namorado teria trazido para a senhora conhecer. Tão boa filha.
- Boa filha, boa filha. Isso é o que pensavam. Aí está a bondade dela. Na hora em que ia dar aulas e ajudar nas despesas da casa me deixa sozinha. Vocês não sabem. Era brasa escondida.
A mesma voz que verifiquei era de D. Marica, voltou a observar que ela não devia falar como se fosse passado.
- Afinal ainda vive e talvez não morra.
Voltou, rápida a cabeça em direção à D. Marica:
- Será que vão me dizer até como devo falar? Repito : brasa escondida. Como o pai. Fechada como ele. Dava mais atenção para essa menina do que para mim. Pra mim era: benção, mãe, ou té logo, mãe... e quando eu me queixava dizia: nasci assim. Não temos nada pra conversar. Ai, que vida a minha. (Passou o lenço pelos olhos secos) Por que Deus tinha que me dar uma filha pra criar sem pai, e ainda ingrata? 
O médico chamou-a e ela foi para o quarto. Já devia ser a hora do almoço quando minha mãe apareceu. Um arco-íris desenhava-se no céu quando deixamos a sombria alameda de ciprestes. Caminhamos algum tempo caladas. Em dado momento me veio a pergunta:
- Ela vai morrer?
- Acho que vai.
- Não queria que morresse. Gosto tanto dela. Não vou ver ela nunca mais. Para onde vão os mortos?
- Não sei. A vida é assim. Nascemos para morrer. É, todos morremos, um dia.
- Eu pensava que as pessoas morriam quando ficassem velhas ou doentes. Virgínia não estava doente. Ainda ontem fomos à confeitaria tomar sorvete.
(Não contei que, depois do sorvete fomos até a casa de Dr. Cláudio para entregar um bilhete para o Paulo, seu namorado. Ele ficou muito branco quando leu o bilhete e, na janela mesmo, começou a escrever uma resposta. Mastigava o cigarro que não acendeu. Depois, ele amarrotou o papel e mandou o recado de que iria vê-la logo à noite).
Minha mãe voltou ao assunto:
- Não não estava doente.
- Ela quis morrer, mamãe?
- Quis.
- Como é que se faz quando se quer morrer?
- Por que quer saber? Crianças de oito anos têm outras preocupações. Pensam em brincadeiras, em coisas alegres.
- D. Marica disse que foi veneno. Para formigas?
- Não queira saber.
- É bom saber, mamãe. A gente, um dia pode querer morrer também.
Minha mãe estacou estupefata. Abaixou-se e me abraçou.
- Não repita nunca mais isso. É pecado, é errado. Ninguém pode tirar a vida de ninguém e nem a sua própria.
No fim-de-tarde desse mesmo dia voltamos à casa de D. Rosa. O movimento havia diminuído. Virgínia estava sentada na sala com o seu melhor vestido, um vestido branco com listras azuis.(Notei a boca queimada). Meus lábios tremeram e., a custo, contive as lágrimas. Acenou para que eu fosse até ela. Abraçou-me com força e me encostou junto a ela. Com o dorso da mão direita fez-me uma carícia na face. Minha mãe não se conteve:
- De quem foi essa idéia de tirá-la da cama? Ela não está em condições de ficar aqui.
- Foi minha idéia. Eu é que decido o que é bom pra minha filha. Estamos esperando o fotógrafo.
Virgínia pousou o olhar na mãe, um olhar demorado e avaliador. Ia me afastar e ela me reteve, apertando de leve minha mão. O silêncio era imenso. Escutava-se apenas a algazarra dos pardais que se recolhiam nos ciprestes.
O fotógrafo chegou e seu sorriso se desvaneceu.
- Pensei que era um aniversário.
D. Rosa apontou Virgínia:
- É ela que vai tirar fotografias.
Falou o fotógrafo:
- Não seria melhor deixar para um outro dia. Quando ela estiver bem?
A voz fria e áspera de D. Rosa fez-se ouvir:
- Ela não vai ficar boa. Se não quiser tirar eu chamo outro.
- Não seja por isso. Vou tirar. É uma opinião.
- Ninguém lhe pediu opinião.
O rapaz preparou a máquina dirigindo-se à Virgínia:
- Como é que você quer? Só o rosto?
Do canto onde estava respondeu D. Rosa:
- Corpo inteiro. De frente e de perfil e quero que fique embaixo do retrato do pai dela para ele aparecer também.
Assim que o rapaz se foi, minha mãe, com delicadeza deitou Virgínia no divã. D. Rosa atirou-se em cima dela, sacudindo-a com violência pelos ombros:
- Diga, diga por que fez isso, sua infeliz. Diga. Não pode morrer sem me dizer.
Ao ter certeza de que jamais teria resposta, permitiu que a arrastassem para o quarto. Desvairada, cabelos defeitos, fazia-se escutar longe:
- A fotografia. A fotografia. A fotografia me dirá.


Referências:
MUNIZ, Léa. A Fotografia. Reproduzido por DIZ, Laura. Blog Caminhar. Disponível em <http://lauravive.blogspot.com/2007/02/conto-fotografia.html>. Acesso em 25 de julho de 2011.
PALACIOS, Fernando R. A contextualização criativa de histórias como fator de sucesso no planejamento de campanhas de comunicação. Trabalho de Conclusão de Curso. Universidade de São Paulo. Escola de Comunicações e Artes: Departamento de Relações Públicas,Publicidade e Turismo. Curso de Relações Públicas. São Paulo, 2007.